Já se passaram 128 anos desde que a escravidão foi abolida no Brasil com a assinatura da Lei Áurea em 13 de maio de 1888, pela princesa Isabel então regente do Império, em nome de seu pai, o imperador Dom Pedro II. A escravidão no Brasil foi marcada principalmente pela exploração da mão de obra de negros trazidos da África e transformados em escravos no Brasil pelos europeus colonizadores do país, utilizados principalmente na agricultura e na mineração.

No entanto, o trabalho compulsório e o tráfico de pessoas permanecem existindo dentro e fora do Brasil, constituindo a chamada escravidão moderna, que difere substancialmente da anterior. Empresas como a Odebrecht, envolvida na Operação Lava Jato por subornos e pagamentos de propinas a políticos e partidos, submeteram trabalhadores a condições análogas à de escravidão na construção da usina de açúcar Biocom, erguida em Malanje (Angola), entre 2011 e 2012, praticando dumping social, situação em que uma empresa se beneficia dos custos baixos do trabalho precário para praticar a concorrência desleal e aumentar substancialmente os lucros.

"É uma situação imoral e absurda, ter que conviver nos dias de hoje com empresas que além de estarem envolvidas em falcatruas com políticos e partidos, praticam atrocidades desta natureza. Com certeza esses não são os verdadeiros empresários de nosso país que produzem e geram empregos de qualidade. São aproveitadores sem escrúpulos que denigrem a imagem do empresariado brasileiro. Ainda bem que temos o Ministério Público do Trabalho sempre atento e que não deixa passar em branco essas aberrações. É preciso punir, pois o ser humano precisa ter condições dignas de emprego e salário", conclui Canindé Pegado, presidente do SINCAB.

A Odebrecht pagará R$ 30 milhões para encerrar uma ação em que era acusada de submeter cerca de 400 trabalhadores a um esquema de tráfico de pessoas e condições análogas à escravidão em Angola.

A empresa e o Ministério Público do Trabalho (MPT) do Brasil fecharam na noite de quinta- feira um acordo em que a companhia se compromete a pagar a multa e cumprir as obrigações impostas em sua condenação na primeira instância, em 2015.

Trata-se da maior indenização em um processo por trabalho escravo da história da Justiça brasileira.

O processo se iniciou após a BBC Brasil publicar uma reportagem em que operários brasileiros diziam ter sofrido maus-tratos na construção da usina de açúcar Biocom, erguida pela Odebrecht em Malanje (Angola), entre 2011 e 2012.

Fotos e vídeos obtidos pela reportagem mostravam péssimas condições de higiene no alojamento e refeitório da obra. Segundo os operários, funcionários superiores retinham seus passaportes após o desembarque em Angola, e seguranças impediam que eles deixassem o alojamento.

Muitos relataram ter adoecido - alguns gravemente - por causa das condições.

Em setembro de 2015, em sentença da 2ª Vara do Trabalho de Araraquara (SP), a Odebrecht foi condenada a pagar R$ 50 milhões por dano moral coletivo - valor agora reduzido para R$ 30 milhões.

A ação tinha como rés a Construtora Norberto Odebrecht e suas subsidiárias Odebrecht Serviços de Exportação e Odebrecht Agroindustiral. Segundo o MPT, as empresas concordaram em pagar 12 parcelas de R$ 2,5 milhões, que financiarão projetos e campanhas que beneficiem a sociedade.

O acordo foi firmado no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. A acusação contra a Odebrecht esteve a cargo do procurador Rafael de Araújo Gomes.

Em nota, o MPT diz ainda que a Odebrecht se comprometeu a deixar de submeter trabalhadores à condição análoga à de escravo, a não utilizar no exterior empregados brasileiros sem visto de trabalho e a não se valer de aliciadores para arregimentar mão de obra.

A violação de cada item resultará em multas que variam de R$ 50 mil a R$ 100 mil por trabalhador.

A Odebrecht não se pronunciou sobre o acordo até a publicação desta reportagem.

Durante a ação, a empresa afirmou que nunca "existiu qualquer cerceamento de liberdade de qualquer trabalhador nas obras de Biocom", que as condições foram "adequadas às normas trabalhistas e de saúde e segurança vigentes em Angola e no Brasil" e que não tinha responsabilidade sobre a obra por ter participação minoritária na usina.

 

Más condições e doenças

Em nota divulgada após o acordo, o MPT afirma que "os operários envolvidos em montagens industriais trabalhavam em condições análogas às de escravo, particularmente no que se refere a instalações sanitárias, áreas de vivência, alimentação e água para beber".

O órgão diz que exames médicos de trabalhadores retornados de Angola mostraram que vários "apresentaram febre, dor de cabeça, dor abdominal, diarreia, náuseas, fezes com sangue, emagrecimento, e alguns apresentaram suspeita de febre tifoide".

As obras na usina pertenciam à Biocom, que tinha como sócios a Odebrecht, a estatal angolana Sonangol e a Damer, empresa de dois generais e do atual vice-presidente angolano, Manuel Vicente.

O MPT diz que provas produzidas durante a investigação revelaram que a Odebrecht Agroindustrial acabou assumindo a gestão da usina após o início das obras.

Embora as condições denunciadas na ação afetassem trabalhadores brasileiros e angolanos, a empresa jamais foi processada no país africano.

 

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