"A luta está apenas começando! O Governo precisará de 308 votos na Câmara para poder aprovar a reforma da Previdência. Mas, ao que tudo indica será uma missão bastante difícil, tendo em vista que as manifestações de 28 de abril abalaram os alicerces do Congresso Nacional e já se fala em dissidência na base aliada. Está começando a crescer os rumores de que as duas reformas não serão aprovadas pelo Congresso da forma como o governo queria. Embora tenha sido aprovada pela Câmara dos Deputados, a reforma Trabalhista corre o risco de ser rejeitada no Senado Federal. O povo foi para as ruas e exigiu os seus direitos. Agora cabe aos deputados e senadores dizer de cada lado realmente estão", diz Canindé Pegado, presidente do SINCAB.

A greve geral da sexta-feira 28 desafiou o sistema de representação política, acredita o cientista político Leonardo Avritzer, professor da Universidade Federal de Minas Gerais. As consequências imediatas, afirma, tendem a ser o declínio do apoio às reformas no Congresso."Os deputados e os senadores têm projetos políticos e eleitorais. Quem não tem é Michel Temer". O acadêmico prevê o aguçamento da crise político até 2018, mas continua a acreditar na realização das eleições presidenciais. Faltaria apoio político e econômico a um novo golpe, analisa.

 

CartaCapital: Como o senhor avalia a greve geral? Que impactos ela pode causar no cenário político e social?

Leonardo Avritzer: A greve geral que tem diversos significados, mas gostaria de enunciar o principal deles, a maneira como ela desafia o sistema de representação política por um motivo principal, a renúncia por esse mesmo sistema político à própria ideia de representação. Quando vemos os níveis de aprovação do governo Temer, que alcançam a marca histórica negativa de 4%, e parece que continua a cair, percebemos um elemento importante: Michel Temer, afora o fato de não ter sido eleito, não representa praticamente ninguém. Isso não parece, porém, fazer diferença. Ele e o Congresso continuam a aprovar leis reprovadas pela grande maioria da população. A greve geral mostrou haver um lado na opinião pública insatisfeito com a representação, mandando o seu recado para um sistema político que se tornou independente da sociedade. Nesse sentido, parece paradoxal a nota do presidente dizendo que as reformas serão conduzidas pelo Congresso. Ele parece ignorar a forte rejeição da opinião pública a este mesmo Parlamento, resultado de financiamento ilegal de campanha e do seu completo envolvimento com a corrupção.

 

CC: O governo Temer ainda terá condições de promover as reformas propostas, em especial a da Previdência?

LA: O governo Temer é paradoxal, pois tem uma origem não eleitoral, em um golpe parlamentar contra Dilma Rousseff. O fato de ele ter uma origem não eleitoral e baixíssima aprovação não o tem impedido de propor fortes mudanças constitucionais. Isso faz parte do projeto político que levou à derrubada da presidente. O preço cobrado pelo mercado são estas reformas. A grande pergunta é qual será a reação do Congresso, pois os deputados e senadores têm um projeto eleitoral. Quem não tem é o presidente. Acredito que a tendência de declínio do apoio ao presidente no Congresso, que, diga-se, estava se manifestando, irá se acentuar, especialmente em relação à reforma da Previdência.

"Provavelmente assistiremos a um aguçamento da crise atual em 2018"

 

CC: O senhor acredita que o governo, amplamente reprovado pela população, conseguirá se manter de pé até 2018?

LA: Provavelmente assistiremos a um aguçamento da crise atual em 2018. O governo Temer terá sua última chance de aprovar mudanças fortes no início do segundo semestre deste ano. Provavelmente ao fim do segundo semestre as principais candidaturas à presidência da República e aos governos estaduais governador estarão na rua e a pouca liderança exercida pelo presidente se tornará nenhuma. Neste caso, haverá na melhor das hipóteses uma manutenção simbólica de Temer no comando.

 

CC: O senhor acredita na possibilidade de antecipação das eleições?

LA: As eleições diretas deveriam ter sido convocadas por Dilma Rousseff no início de 2016, quando a proposta do impeachment se fortaleceu. O motivo pelo qual eleições diretas devem ser convocadas está ligado ao fracasso do sufrágio de 2014, que não serviu para discutir nem as possíveis soluções para a crise econômica nem as possíveis formas de enfrentar a crise política. O governo Michel Temer tem uma solução não sancionada eleitoralmente para ambas as crises. O único problema é a forte rejeição da população às suas propostas, que se soma ao não sancionamento eleitoral. A melhor solução para a crise é a convocação imediata de eleições para por fim ao desrespeito absoluto às regras do jogo democrático e deixar a população apontar as possíveis saídas para a crise.

 

CC: Teremos eleições presidenciais em 2018? Há riscos de um novo golpe?

LA: Evidentemente que há uma forte diferença entre realizar um golpe parlamentar e o cancelamento de eleições programadas. Houve no ano passado a remoção de uma presidente eleita e sua substituição pelo vice, apesar de todas as evidências comprovadas pelo depoimento de José Yunes da participação de Temer em reuniões nas quais se negociou propina com a construtora Odebrecht. Ainda pior foi a natureza do envolvimento do atual presidente, que buscou pelo financiamento ilegal, distorcer a representação no Congresso - sabemos fundamental para o Parlamento continuar a aprovar as reformas, apesar da sua natureza socialmente regressiva. Tudo isso é diferente de suspender eleições programadas. Se acontecer, seria o completo fim de qualquer resquício de ordem democrática. Não acredito que Temer tenha apoio político ou econômico para dar este passo adicional.

 

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